sábado, 13 de novembro de 2010

Aston Martin V8 Vantage: mal educado

Não se deixe levar pela aparência. Este inglês está mais para hooligan do que para um lorde

João Anacleto - fotos: divulgação/João Anacleto

Aston Martin Vantage V8 Coupé

Aston Martin Vantage V8 Coupé


Ele estava numa vaga de garagem, à sombra de um prédio que escondia o sol das 10 da manhã. O vermelho de seu “corpo” estava mais para um bordô do que para o Fire Red que a sua ficha técnica informa. Movi-o alguns metros à frente e o sol da Califórnia mostrou a verdade. O rubro vibrante que reluziu sacudiu os meus joelhos. Chegara a hora, finalmente, de eu ter a dimensão do que é andar numa lenda britânica — categoria desconhecida por mim, até então.

Aston Martin Vantage V8 Coupé

Antes, ainda o admirei por alguns minutos. Queria entender os R$ 600.000 pedidos pelo Vantage V8, modelo de entrada da Aston Martin que desembarcou no Brasil em 19 de agosto. Tentei, em vão, encontrar semelhanças com ou­tros esportivos, e em vão. Tudo nele trans­borda identidade. Entendi, em partes, o valor cobrado, anabolizado pelo adje­tivo “exclusividade”. Depois de fotografá-lo sob todos os ângulos possíveis, per­cebi que colocá-lo na sala de casa já me satisfaria... “Ha, ha, ha... Vamos acele­rar!”, me cobrou a consciência.
Destravei a porta com a chave feita de cristal, que se encaixa no painel como o sapato da Cinderela. E quem ficou encantado fui eu. Três luzes se acenderam numa faixa de fibra embutida na porta e, ao pressioná-la, surgiu uma espécie de maçaneta, que deve ser puxada para entrar. Engenhoso, arrancou aquele “nosssssa” da minha boca.

Ao me acomodar no banco, meu 1,90 m coube sem maiores problemas. As regulagens elétricas ficam do lado direito, na parede do console central, que é bem elevado. Por ser inglês — sinônimo de requinte, lembrado até pela Hyundai —, e de ter no currículo histórias variadas do imaginário e arte britânicos (não é, James?), era de se esperar luxo no acabamento, como as costuras dos bancos, portas e painel feitos à mão. Mas, sinceramente, pelo preço cobrado, achei que economizaram em itens bobos, como as hastes da seta e dos limpadores de para-brisa, muito finas, e na regulagem manual de altura e de distância do volante.
Nas fotos, você vê o habitáculo, mas não do mesmo jeito que eu vi. A versão avaliada não tinha câmbio manual, e sim robotizado, chamado Sportshift, no qual não há alavanca. Nele, você seleciona o câmbio por botões no painel (R, N e D) e aciona a configuração Comfort. Caso contrário, ele fica em modo Sport. Assim, ele já começa os trabalhos com desvios de comportamento. As recomendações antes do teste eram “não realizar testes ou tomadas de tempo em circuito”, e “não rodar mais de 240 km”. Para um dia, até que estava bom.


Medo e curiosidade
Apertei a chave de cristal no painel e o ronco que surgiu em nada tinha a ver com ele. Foi como se o Roberto Justus fa­las­se com o mesmo timbre do Tim Maia. Grave, rouco. Misturou medo e curiosida­de. Não combinava com a fachada.
Ao arrancar, o câmbio robotizado fez a embreagem desacoplar aos poucos e senti que o Aston “rateia” um pouco na saída, com uma leve trepidada. Toda a imponência bretã dá lugar a uma alma inesperada. A brutalidade com que ele reage ao toque do acelerador me fez esquecer o visual externo. O giro sobe rápido, e a partir dos 4 500 rpm alguns estampidos agudos rompem o som grave contínuo. Não havia motivos para ir embora. Ele é um pecado capital ao volante. Duro de evitar.
A cada troca de marchas, que também podem ser feitas por borboletas bem grandes, no estilo Ferrari Modena, o tranco é forte. Também pudera, não dá para esperar comportamento de um lorde quando você vê a “ficha corrida” de um hooligan. São 426 cv a 7 300 rpm e 47,9 mkgf de torque a 5000 rpm num V8 de 4.7 litros. Tudo aspirado.
Ao mesmo tempo em que essa explosão o joga para frente e para trás, o conjunto de suspensão, multibraço nos dois eixos, trabalha com suavidade. Na Califórnia também há valetas e emendas no piso, geralmente feito de concreto, mas, mesmo assim, foram raros os momentos de desconforto. Por outro lado, a sua capacidade dinâmica é tolhida pelo ESP pouco permissivo. Mas também é on ou off, e com o item desligado, o carro exibe mais da sua veia “desordeira”. Coração, olhos, ouvidos e até o nariz — os pneus de 20” berram por socorro — entram em estado de alerta. Assim, o Vantage V8 acelera de 0 a 100 km/h em 4s9.
Uma das grandes atrações do Vantege nos EUA é o sistema de som Bang & Olufsen, com tweeters que se erguem no painel ao ligá-lo. Lá, custa US$ 7 200, mas é de série no modelo “brasileiro”. Além dessa boa nova, o melhor foi saber que um inglês consegue perder a educação com o motorista. Como deve ser!

Nenhum comentário:

Postar um comentário